terça-feira, 3 de março de 2015

Apesar do atraso, Comissão da Verdade pretende resgatar memória do Regime Militar

por Vinicius Martins

No dia 18 de novembro de 2011, a presidente da república Dilma Rousseff sancionou a lei que permitiu a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Essa comissão deve investigar, analisar e documentar violações contra os direitos humanos ocorridas entre o período de 1946 e 1988, sobretudo durante a Ditadura Militar brasileira.

Composta por sete ministros – escolhidos pela presidência da república – mais catorze assessores, a comissão foi instalada no dia 16 de maio de 2012. Desde essa data ela tem permissão para atuar durante dois anos. No fim desse período, a CNV deve organizar um relató- rio com todas as informações levantadas nas investigações.

A Comissão Nacional da Verdade não tem caráter jurídico, ou seja, não pode julgar nem punir acusados de violar os diretos humanos no período investigado. Também é função da delegação identificar corpos e o paradeiro de desaparecidos políticos do regime militar, além de locais e estruturas usadas em crimes contra a humanidade.

Claudio Lemos Fonteles, um dos sete ministros da comissão nacional, acredita que a CNV tem papel político e social importante no resgate da memó- ria brasileira. “Devemos internalizar em cada brasileira, em cada brasileiro, a consciência de que os Direitos Humanos devem ser protegidos; que a solução do arbítrio jamais deve voltar a ser experimentada no afã de tentar solucionar as divergências de pensamento e de posições políticas que surjam entre nós; que a violência, portanto, não é, e jamais será, solução de conflitos. Essa é a nossa missão hoje e sempre”, explica.

(charge: Latuff)
Para auxiliar o trabalho da CNV, o órgão enviou recomendações para os 27 estados brasileiros criarem comissões estaduais. Até o momento São Paulo e Pernambuco já têm delegações constituídas.

Fonteles reforça a importância da criação de mecanismos regionais: “para auxiliar no trabalho da Comissão Nacional nos Estados, a existência de comissões estaduais e de instituições comprometidas, como universidades e órgãos de classe, é fundamental para que em nosso país nunca mais aconteça a nefasta experiência da supressão das liberdades pessoais e públicas”.

A Comissão da Verdade “Rubens Paiva” fundada no estado de São Paulo irá contribuir na apuração de violações dos direitos humanos. Diferentemente da CNV, o grupo paulista irá apurar apenas casos que aconteceram entre 1964 e 1982. “Nós vamos investigar 140 casos de pessoas que eram do estado de São Paulo e foram assassinadas, como os irmãos Petit que eram da região de Bauru, por exemplo. Eles foram mortos no Araguaia. Serão casos de paulistas ou de pessoas que morreram aqui no estado durante o regime”, reforça o deputado estadual Adriano Diogo, presidente da comissão estadual paulista.

Comissão bauruense

Além dos órgãos em nível nacional e estadual, há incentivo para que municípios e universidades criem seus grupos de apuração. Em Bauru, durante a II Jornada de Direitos Humanos da cidade, em 2012, foi proposta a criação do Grupo Memória e Verdade. A equipe, composta por sete membros, terá a fun- ção de levantar dados e informações correspondentes ao regime militar no município. Segundo os integrantes, “as investigações abordarão as questões políticas da época, a imprensa, a Frente Anticomunista (FAC), a atuação da Igreja Católica, dos movimentos sociais e casos de perseguidos e presos políticos da cidade”.

Atraso

O Brasil é o último país latino-americano a criar um órgão de estudo e análise dos crimes contra a humanidade, cometidos pelo Estado, durante um regime militar. Na América Latina países como Argentina, Chile, Uruguai, Peru e Guatemala já apuraram e, em alguns casos, puniram infratores dos direitos humanos em seus períodos de repressão.

Estima-se que no mundo mais de 30 comissões da verdade tenham sido criadas. Fora do continente americano, uma das mais conhecidas é a da África do Sul. O mecanismo foi criado para apurar crimes cometidos entre 1948 e 1994, período que corresponde ao Apartheid, regime de segregação racial comandado por uma minoria branca.

No Brasil, há a intenção de aprender com outras comissões do mundo, inclusive com as da América Latina. Segundo Cláudio Fonteles, da CNV, o diálogo com outras comissões é muito importante. “Em setembro, a Comissão Nacional da Verdade realizou no Itamaraty um seminário com integrantes de Comissões da Verdade da Amé- rica Latina. Esse intercâmbio é fundamental para dimensionar nosso trabalho. Dialogar com os outras nações nos dá a vantagem de evitar a repetição de erros e mirar nos acertos, guardadas, é claro, as diferenças culturais e legislativas entre nossos países”, aponta. 

Números da ditadura civil-militar brasileira


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